Errâncias

- Onde estás?
- Estou aqui.
- Não me deixes!
- Nunca o farei.
- Quando acordar, estarás aqui?
- Sabes que tenho de partir, o Mundo precisa de ser descoberto.
- Mas tu acabas-te de dizer que…
- Sim, eu sei. Cumprirei a minha promessa.
- Como?
- Dorme. Amanhã digo-te.
- Já não quero dormir. Se abrir os olhos e não te vir na sombra da luz da manhã, não me conseguirei levantar.
- Ficarás bem.
- Não sei… Porquê tanta ânsia do Mundo?
- O Mundo é uma rua e eu sou o seu vagabundo. Ficar neste quarto é como o percorrer com uma venda, sem encontrar o rumo.
- Então e eu?
- Tu és a mão que me guia na cegueira. Que me indica o caminho certo e me dá a força para continuar.
- Preferia não o ser…
- Não digas isso. Se tu soubesses o vazio que me enche sempre que saio por aquela janela e te deixo para trás, não dirias tais palavras.
- Só não compreendo essa tua vontade incontrolável.
- É natural que não. Os teus olhos ainda estão cobertos com esta venda que não te deixa ver a verdadeira beleza do que te rodeia.
- Porque tu não queres.
- Já te expliquei a razão. Não voltarei atrás, desculpa.
- É agora que vais?
- É sim. Agora dorme e sonha comigo. Quando acordares estarei longe daqui. Se me esqueceres eu não voltarei, por isso guarda-me dentro de ti, que um dia ter-me-ás de novo a teu lado. Prometo.

Acordei com o sol a bater-me na cara. O espelho à minha frente exibia uma figura estranha, com olhos vermelhos e as maçãs do rosto coradas. Os lábios mostravam múltiplos cortes feitos pelos dentes enraivecidos procurando uma forma de se acalmarem.
Aquela pessoa não era eu.
Não podia ser.
Nesse momento compreendi o significado daquela frase tardia. Levantei-me, aproximei-me da janela e deixei-me envolver em cada imagem que via.
Estava pronta.
E foi aí que parti.
Sem rumo.
Para junto de ti.

Sem comentários:

Viajantes

A minha foto
Nerd para mim é um elogio!

Memórias passadas